– Ei galera, minha mãe disse aqui que aquele
véa da esquina ligou pros’ome. Se tiver com os flagrante intoca ali e é de
booa, fica ai mermo. FOI AQUELA VÉA LÁ, NA ESQUINA – Falou alto pra que ela pudesse escutar de lá.
– Intão, vei! Valeu ai, a
gente tá vazando já, falou.
No outro dia, no mesmo lugar:
– Seria massa a gente trocar uma ideia com Maninho
sobre aquela história de ontem, ele mora aqui, ele deve saber.
– Intão.
– Oxe, falando nele, ó ele lá!
– EEI PAULINHO – acenando – CHEGA AI!
– INTÃO, DEIXA EU FALAR COM A RAPAZEADA AQUI! E
ai...
– La vem ele...
– Dale rapaziada.
– Dale.
– Dale. Ei mermão, ontem rolou uma ideia errada
aqui...
– Oxe, qual foi?
– Aquela véa da esquina é fofoqueira é?
– Mermão, é sim, visse... é foda ela. Mas qual
foi a ideia?
– Disseram que aquela véa da esquina ali chamou
os’ome pra gente porque a gente tava fumando maconha aqui, isso é onda, é? Ai a
gente queria saber se era ela mesmo fofoqueira.
– Oxe, é bem possível mermo, visse, ela ter
feito isso. Mas como ficaram sabendo que foi ela que chamou?
– Sei não, a galera que disse ai, por isso que
a gente queria saber se ela era fofoqueira.
– Deve ter sido ela mermo visse..
– Intão, esse bicho aí ta a fim de trocar uma
ideia com ela sobre isso.
– É quente, visse.
– Intão, deixa arrear a lombra um pouquinho que
eu chego la.
– Boa noite senhora.
– Boa noite.
– Posso falar um pouquinho com a senhora?
Ela um pouco intimidada
– Pode falar.
– Poderia ser longe das crianças? É só um
instantinho..
– Não, pode falar aqui mermo..
– Ta certo então. Disseram que a senhora ligou
pra polícia ontem.
Ela desviou o olhar.
– Foi a senhora mesmo?
– Foi.
– Veja, eu me chamo Francisco, tenho 25 anos e
moro aqui há 20. De manhã sou professor de história e de tarde eu dou aula de
geografia. E ainda estou terminando meu mestrado.
Ela balança a cabeça *not too
bad
– Por que a senhora chamou a polícia pra gente?
A senhora não quer que a gente fume maconha ali, é?
– É
– E por que a senhora não falou com a gente?
Por que não chegou pra conversar?
Ela se irritava
– “Por favor rapaziada, vocês poderia parar de
fumar maconha aqui nessa praça, tem criança aqui...” por exemplo... Mas chamar
a polícia, a senhora não acha um pouco violento não isso aí?
Ela escutava
– Eu não ia me arriscar...
– Arriscar? O que? Mas olhe essa, somos seres
humanos! Se você queria proteger suas crianças da maconha, tas fazendo o
contrário. Agora elas viram que pessoas de bem também fumam maconha, e
aprenderam que isso não tem nada a ver. Ou você vai dizer que sou gente ruim?
Todo mundo me conhece aqui, pode perguntar pra qualquer um se alguma vez eu já
fiz alguma merda.
Ela ficava meio confusa.
– Os tempos mudaram, minha senhora. E não sou
eu o culpado. A necessidade dessa transformação na humanidade é mais culpada do
que qualquer cidadão isoladamente. É uma pena que contrarie a senhora, essas
mudanças. E obrigado pela sua atenção. Boa noite.
– Boa noite – como se tivesse sido obrigada.
Ele saia e ela já murmurava.
– Ah, e não chama mais a polícia, por favor, ta?!
Nós não vamos fazer mal a ninguém, eu juro! Só vamo fumar nossos beck ali
mesmo, de boinha...
– E ae, falasse com a véa?
– Intão
– Como foi la?
– Eu cheguei la e mandei a ideia. Ela ficou
meio assim, mas é nenhuma, foi de boa.
– É foda essa galera, ta ligado, Júnio? Faz
porra nenhuma da vida, vive trancada em casa, não vive nada. Aí precisa ficar
vivendo a custa da vida dos outro. Querendo ver o circo pegando fogo que é pra
poder ter alguma história pra contar pras outras véa no telefone mais tarde... Termina
fodendo a gente que passa o dia suando e só quer fumar uma coisa com a galera
de noite. Mas é nenhuma, a gente vai evitando os conflitos. Eu vou indo nessa
que já deu minha hora. Falou rapaziada.
– Éé, intão. Se os homi vim a gente num tem
nada aqui, só uns beck já enrolado, não vão achar nada, nunca. A gente num é
nada, Maninho, a gente aqui só fuma mermo... Amanhã a gente ta de volta.
– É queente! Falou galera.
– Falou.
– Falou.